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Review Juristas contra a democracia: usos do direito e desintegração democrática no Brasil pós-2014.

O review analisa o artigo produzido pelos pesquisadores Alexandre Zaidan e Maurício Palma, “Juristas contra a democracia: usos do direito e desintegração democrática no Brasil pós-2014”, levando em consideração as repercussões do ativismo judicial no cenário político brasileiro e as diversas questões relacionadas ao tema.

Resumo: Utilizando como referencial teórico o artigo “Juristas contra a democracia: Usos do direito e desintegração democrática no Brasil pós-2014”, elaborado em 2019 pelos pesquisadores Alexandre Douglas Zaidan, professor do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Católica do Salvador/UCSal, e Maurício Palma, doutor em Direito pela Universidade de Brasília, Unb, o trabalho busca compreender as repercussões do protagonismo judicial no cenário político brasileiro, com enfoque na crise política alastrada desde meados de 2014. Portanto, ao refletir sobre as problemáticas trazidas pelos autores, analisamos como os fenômenos do ativismo judicial e da instrumentalização das formas jurídicas repercutem na democracia contemporânea.

Palavras-chave: democracia, judicialização anticorrupção, Operação Lava Jato.

1. Introdução

Os recentes acontecimentos políticos brasileiros representam um terreno fértil para inúmeros estudos que possibilitem sua compreensão. No que cerne ao Direito, a atuação do Poder Judiciário na esfera política configura um dos grandes objetos de análise, considerando a crescente tendência de protagonismo judicial.

É a problemática trazida pelos pesquisadores Alexandre Douglas Zaidan e Maurício Palma no artigo científico “Juristas contra a democracia: Usos do direito e desintegração democrática no Brasil pós-2014”, elaborado em 2019, no qual alertam sobre os impactos do ativismo judicial para o regime democrático.

Ao desenrolar do artigo, percebemos que seu objetivo principal é analisar a contribuição do direito para o aprofundamento da crise político-institucional brasileira. Para tanto, os autores demonstram a participação significativa de operadores do direito no referido processo, tendo em vista o protagonismo destes agentes em progressivas violações de expectativas juridicamente protegidas.

Para viabilizar a análise, o ano 2014 é utilizado como marco temporal por desencadear inúmeros acontecimentos relevantes para o fenômeno estudado, tais como o início da operação Lava-Jato, a ocorrência de eleições presidenciais e o crescimento de protestos populares. Portanto, o desenrolar político é analisado a partir de fatos políticos conectados com a atuação de figuras notórias no espectro jurídico.

Primeiramente, sob uma perspectiva histórica, foram observadas modificações no posicionamento destes agentes na sociedade. Se antes eram vistos como exercentes de funções politicamente neutras, restritas à interpretação e aplicação imparcial de leis, agora, através de suas atividades profissionais, são protagonistas de questões especialmente sensíveis, tais como a luta anticorrupção. Como suscitado, os representantes do judiciário alçaram a si próprios à condição de estabilizadores e catalisadores das tensões entre a política e o direito (CARVALHO; PALMA, 2020).

No desenvolvimento do estudo, é importante salientar a reflexão proposta pelos autores acerca do contexto socioeconômico privilegiado no qual os operadores do direito estão inseridos. Assim, diante do elevado nível de desigualdade social do país, estes agentes não economizariam articulações e esforços para a manutenção de seus privilégios, fenômeno ora entendido como “juristocracia”.

Em suma, ao reconhecer o impacto da atuação jurídica no cenário político brasileiro, os autores demonstram o papel estratégico da luta anticorrupção para a inclusão dos operadores do direito em um campo moralizador da política. Desta forma, o exercício imparcial, meramente técnico, de suas profissões seria prejudicado pela mobilização de discursos e representações carregadas de emoção, repercutindo diretamente nos princípios democráticos.

Então, podemos perceber que a tese dos autores foi desenvolvida a partir de três principais argumentos: (i) demonstração da moralização do discurso jurídico através da pauta anticorrupção (tópico 2); (ii) análise concreta sobre o contexto político brasileiro e os impactos do protagonismo jurídico para o regime democrático (tópico 3); e (iii) análise do fenômeno da juristocracia, pautado como um instrumento de manutenção de privilégios (tópico 4).

2. Os juristas, os juízes e a política no Brasil no pós-2014

Neste primeiro momento, os autores buscam demonstrar como a construção de uma imagem pública que relacionava o sistema de justiça ao combate à corrupção contribuiu significativamente para a crise política estudada. Para tanto, utilizam a Operação Lava Jato para exemplificar a aproximação entre os fenômenos de “criminalização da política” e “moralização do combate à corrupção”, de forma que juízes, membros do Ministério Público e advogados teriam ganho notoriedade e vasto apoio popular justamente por estarem engajados nesta luta.

Importante também ressaltar que a problemática abordada não se encontra nos projetos propriamente ditos, mas sim a maneira como foram promovidos à sociedade. Assim, o ponto que devemos nos atentar é a forma como os representantes destas pautas conquistaram vasto apoio popular através da propagação de um discurso moralizador e nacionalista, e, consequentemente, encontraram validação em condutas que, mesmo consideradas antidemocráticas e ilícitas, aparentariam estar em prol do combate à corrupção.

Neste contexto, condutas recentes de representantes do sistema jurídico na área pública, tais como as do promotor Deltan Dallagnol e do ex-juiz Sérgio Moro, são utilizadas para exemplificar a problemática. Como mencionado pelos autores, houve a articulação de um movimento tão amplo que resultou numa espécie de blindagem da operação Lava Jato, resultando na pretensão de tornar automaticamente os seus críticos como defensores da corrupção (CARVALHO; PALMA, 2020).

Portanto, diante da conquista de apoio em larga escala, os autores salientam a importância de refletir sobre os respectivos impactos no regime democrático. Apoiar uma luta intensamente pode facilitar a concentração de poder nas mãos de seus representantes, de maneira suficiente para protegê-los de eventuais críticas e, ainda, validar a inobservância aos direitos e garantias fundamentais.

Tal concentração de poder arguida pelos autores está relacionada com uma questão muito abordada na esfera acadêmica, o ativismo judicial. Basicamente, o protagonismo dos juristas em questões políticas e tomadas de decisão, como problematizado na Operação Lava Jato, estaria relacionado com a sobreposição do Judiciário em relação aos demais Poderes, em contramão ao idealizado pelo filósofo francês Montesquieu, conforme abordaremos em seguida.

2.1. Separação dos Poderes e sobreposição do Judiciário

Um dos grandes pilares do constitucionalismo moderno reside no princípio da separação dos Poderes, idealizado pela obra de Montesquieu, O espírito das leis e instrumentalizado para efetivar o fundamento de limitação do poder.

A essência desta concepção, advinda das revoluções liberais do século XVII, consiste na identificação das principais funções desempenhadas pelo Estado – Legislativa, Executiva e Judiciária- em estruturas orgânicas, independentes e harmônicas entre si, detentoras de mecanismos de controle recíproco – checks and balances. Desta forma, foram estabelecidas as seguintes funções para cada um destes:

Com o primeiro, o príncipe ou o magistrado faz as leis por um tempo ou para sempre, e corrige ou revoga as que foram feitas. Com o segundo, faz a paz ou a guerra, envia ou recebe embaixadas, estabelece a segurança, previne as invasões. Com o terceiro, pune os crimes, ou julga os diferendos dos particulares. A este último chamar-se-á o poder de julgar, e ao outro simplesmente o poder executor do Estado. 1

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